Artwork for podcast Hextramuros Podcast
"LEGÍTIMA DEFESA EM TRIBUNAIS DE JUSTIÇA BRASILEIROS." Parte II
Episode 745th April 2024 • Hextramuros Podcast • Washington Clark dos Santos
00:00:00 00:28:31

Share Episode

Shownotes

Na segunda parte, concluo a entrevista com o Juiz Federal TIAGO AGUIAR, autor do livro AÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA EM TRIBUNAIS DE JUSTIÇA BRASILEIROS, abordando a fascinante e polêmica temática da excludente da legítima defesa com o uso da arma de fogo.

Saiba mais!



This podcast uses the following third-party services for analysis:

Podkite - https://podkite.com/privacy

Transcripts

ANFITRIÃO 0:14

Honoráveis ouvintes! Sejam muito bem vindos a mais um episódio do Hextramuros Podcast. Sou Washington Clark dos Santos, seu anfitrião. No conteúdo de hoje, concluo a entrevista com o juiz federal Tiago Aguiar, versando sobre o tema "Ação de Legítima Defesa nos Tribunais de Justiça Brasileiros. Moderação e Balística Terminal." Título da obra escrita por ele, recentemente lançada pela editora de D'Plácido.

Retornando aos questionamentos Dr. Tiago, quais são os principais equívocos ou mal entendidos que identificas nas discussões públicas sobre letalidade policial?

CONVIDADO 1:05

Eu acredito que um dos grandes equívocos na discussão sobre a letalidade policial seja considerar que uma ação policial em legítima defesa seja letalidade policial. Veja: se o Estado agiu naquele momento para proteger a sociedade, para o policial se proteger, proteger um terceiro na legítima defesa própria de terceiro, ele agiu sob o manto da lei, sob o manto do Estado. Portanto, a conduta dele e lícita! A conduta dele é legal! Não há crime! Você não pode classificar uma conduta como letalidade policial quando ela está sendo exercida em legítima defesa. Me parece que muitas vezes essas condutas em legítima defesa são classificadas como crimes letais intencionais contra a vida. Se houver excesso - e há excesso, como há excesso, acredito, em todas as profissões, tem que ser punido exemplarmente! Eu costumo dizer que um criminoso de farda é pior do que um criminoso sem farda, porque ele está usando o Estado. E eu acho que a gente tem que dar esse exemplo sempre! O criminoso comum já é ruim e, o criminoso de farda, é pior ainda! Qualquer farda! Pode ser a toga do juiz, do promotor, do policial, do fiscal do IBAMA, do guarda de trânsito, enfim, qualquer um, que está usando o Estado para fazer o crime! Eu acredito que a primeira discussão é essa: classificação! Uma questão, também, é o seguinte - vou pegar aqui dos dados do nosso colega, Onivan Elias de Oliveira - grande colega - especialista em vitimização policial no Brasil. Ele traz notícias, realmente, a partir dos dados do DATASUS/SIM - Sistema de Informação de Mortalidade, do Ministério da Saúde. Você pode entrar na internet e você bota lá e você vê causa mortis. Isso é um dado empírico e é válido! Você pega lá e vê; como os médicos do Brasil informam no atestado de óbito, tem que mandar para o cartório! E ele classifica a morte. Foi por arma de fogo? Foi homicídio? Foi suicídio? Você pega as discussões originárias e, a partir daí, você junta os dados dados do inquérito da polícia para comparar. Me parece que, por tudo que a gente vê, pegando também os dados do IPEA, a gente verifica que a maioria dos homicídios brasileiros são jovens entre 25 e 35 anos. Os jovens de 25 a 35 anos, hoje, matam, são homicidas e, amanhã, os jovens de 25 a 35 anos, são vítimas! E aí a gente tem causas: acerto de contas, drogas, crime de vizinhança...Infelizmente, nós temos pobreza, desemprego! Então, a letalidade policial, me parece, não é a principal causa de homicídios no Brasil! Se se faz uma discussão séria, pegando os dados do Ministério da Saúde, do Sistema de Informação de Mortalidade, se se pega os dados do IPEA, você verifica isso! Partir para um discurso ideológico é que não dá! Seja para um lado ou seja para o outro! Tem que se pegar dados empíricos e científicos. Acho que há muita discussão sem base científica, sem base empírica. Eu acho, até, que os dados, muitas vezes, são muito difíceis de serem obtidos, porque cada estado tem uma forma de classificar diferente a letalidade! E os dados que muitas vezes vêm do Fórum Nacional de Segurança Pública são dados compilados, são dados que são mandados por ofício das secretarias. Não se tem um cuidado de verificar, checar. E muita notícia de imprensa, data máxima venia, a imprensa tem que ter responsabilidade de checar a fonte. Precisa pegar dados públicos! Dados do Ministério da Saúde, um dado de um órgão público, da Medicina, do IML, pegar os IPL's! Eu acho que a gente trabalha, no Brasil, muito ruim com essa parte de dados! É um grande problema! É outro equívoco que, inclusive, nosso colega Onivan fala bastante!

ANFITRIÃO 5:59

Qual a sua opinião sobre a relação entre o uso da força policial e a necessidade de se proteger a sociedade e como a incapacitação balística pode ser compreendida no contexto dos Direitos Humanos?

CONVIDADO 6:17

A gente sabe que dentro das Ciências Policiais existe essa questão. Inclusive, há um normativo da ONU que fala sobre os princípios básicos para serem utilizados pelos funcionários públicos encarregados da aplicação da lei em relação ao uso da força. Tem aquela lei brasileira que fala um pouco sobre isso. Tem aquela portaria interministerial, também. Mas, a legítima defesa, o grande marco é o Código Penal! Porque, quando se fala em legítima defesa, no caso concreto da dissertação, eu limitei, restringi a pesquisa à ameaça letal. Letal ou àquelas que causem lesões a direitos fundamentais, direitos inerentes à dignidade da pessoa humana. Até trago, lá, o artigo do nosso amigo Frisch - o alemão (Wolfgang) Frisch - que hoje é um grande discípulo de Roxin. É uma pessoa referenciada hoje na Alemanha. Trazer uma menção a Frisch, a despeito de não haver classificação, hierarquia de normas para efeito científico, é uma grande fonte de pesquisa. Caiu como uma luva para a minha pesquisa o artigo de Frisch, porque Frisch fundamenta o uso do direito da legítima defesa arrojada no princípio da dignidade da pessoa humana. Ou seja, Frisch fundamenta a legítima defesa no direito humano mais fundamental de todos, que é o direito da dignidade da pessoa humana. Não existe direito mais fundamental do que o direito à dignidade da pessoa humana! Não existe! Na Alemanha se admite a legítima defesa, inclusive armada, com arma de fogo, para proteger qualquer direito, inclusive patrimonial! Se alguém tiver furtando sua BMW e você não tiver outro meio, o único meio disponível for a arma de fogo, ele já está longe, você não tem como dar um murro, nada, no direito alemão, hoje, grande parte dos julgados e da literatura, admite você usar arma de fogo para defender patrimônio! Eu não estou falando de roubo! Roubo, você está sujeito a ser lesionado ou morto! Está pacificado: se alguém vai te roubar com arma de fogo, você pode atirar nele para se defender! Eu estou falando de furto! Para o alemão, grande parte da literatura defende que você pode usar a arma de fogo para questões patrimoniais. Isso eu não discuto no Brasil! Para o Brasil, eu acredito que, nesse ponto, vai se adaptar à literatura, porque a nível da ONU, de tratados internacionais, existe essa ideia de que o uso da arma de fogo como opção da legítima defesa tem que ser para questões realmente fundamentais. E aí, o que é que Frisch fala, que a gente adota na dissertação? Veja: eu posso usar um arma de fogo contra alguém, toda vez que esse alguém estiver me ameaçando no meu direito à vida, no meu direito à minha integridade física, no meu direito à minha liberdade física - o "cara" está querendo me sequestrar - ou na minha liberdade sexual - ou seja, o "cara" está tentando me estuprar ou está me estuprando. Porque esses direitos são direitos inerentes à dignidade da pessoa humana! Dignidade da pessoa humana da vítima! Temos que pensar na vítima! Direito Penal não só pode pensar no réu, não! Réu é importante? É! Mas, vítima é muito importante! A vítima é muito importante! Então, Frisch fala: todas as vezes que o agredido estiver sendo ameaçado no seu direito à sua dignidade da pessoa humana, da vítima, ou seja, do agredido, se toda vez que o agredido for vítima de uma ameaça à sua vida, à sua liberdade física, à sua integridade, à sua liberdade sexual, pode usar arma de fogo. Ele fundamenta a legítima defesa com o uso de arma de fogo nos direitos humanos. Partindo para outro ponto do uso da força: se você pegar a resolução da ONU que fala sobre a aplicação do uso da força e que se fala muito de uso seletivo da força, o uso diferenciado da força - tem que transcrever do inglês que está na resolução - o tempo inteiro, se fala na proteção do funcionário encarregado da aplicação da lei. Ou seja, do policial ou do militar! Então, todas as vezes que a vida, a integridade física do policial estiver em jogo, pode ser usado arma de fogo. A ONU fala isso! A lei que está em vigor no Brasil hoje, que veio tentar regulamentar essa resolução, fala essa resalva. Ela fala: "não se pode atirar em bloqueio policial", "não se pode atirar em ninguém em fuga" - "VÍRGULA!" - exceto em legítima defesa. Então, todas as vezes que alguém for furar um bloqueio policial, todas as vezes que alguém estiver em fuga, mas estiver apontando uma arma para o policial ou apontando arma para alguém, o policial está legitimado a usar a arma de fogo. Isso é o que a ONU fala! Isso é o princípio da dignidade da pessoa humana da vítima! Isso é o que Frisch fala! Tem que se falar em direito do agredido! O policial é agredido! O limite é: enquanto durar a agressão. Moderação é: tantos tiros quanto bastem, enquanto durar a agressão. Soltou a arma, para de atirar! Essa é a questão! A gente tem que compreender a legítima defesa de acordo com os direitos humanos, pensando na proteção da vítima, do policial e pensando no princípio da dignidade da pessoa humana dessa vítima. É desse jeito que a gente tem que entender a legítima defesa! E dos princípios gerais que eu trago na minha dissertação, são os princípios da preponderância do direito perante o injusto e da proteção dos bens jurídicos. Peço para vocês lerem minha dissertação para vocês checarem.

ANFITRIÃO:

Como a diversidade de decisões judiciais em casos de legítima defesa pode impactar a confiança da sociedade no sistema judicial?

CONVIDADO:

É latente que a diversidade de ações judiciais pode impactar na confiança da sociedade no sistema judicial e que, às vezes, não entende o mecanismo jurídico. Mas acredito que, por exemplo, a aplicação de precedentes judiciais no Supremo, no STJ, a partir de uma cientificidade, do conhecimento da balística terminal, da base dos ferimentos, a partir do momento em que isso fosse consagrado, ajudaria bastante! Imagine se a seguinte súmula vinculante, vou criar uma agora, se eu fosse do Supremo: "a quantidade de disparos efetuados na ação de legítima defesa, vírgula, por si só, não implicam em excesso da legítima defesa." Pronto! Com uma súmula seria um indicativo para o jurado - a gente sabe que tem o Princípio da Íntima Convicção - vai ser um indicativo para os jurados, para os tribunais de quê, desta tese, os tribunais do Brasil inteiro iriam estudar essa tese da balística terminal, da balística dos ferimentos! E se esse tema do Supremo ainda trouxesse o estudo da Física e o estudo da Medicina dentro dos seus fundamentos, seus precedentes, melhor ainda! Veja que um caso concreto desse é um caso de um precedente judicial. Uma repercussão geral do Supremo daria, por exemplo, uma uniformidade grande às decisões judiciais! Mas um caso desse precisaria ser bem amadurecido para chegar no Supremo.

ANFITRIÃO:

Quais são os principais aspectos a serem considerados ao reformar ou atualizar a legislação sobre legítima defesa no Brasil?

CONVIDADO:

Para mim, o principal aspecto a ser reformado na legislação sobre a legítima defesa do Brasil foi aquilo que se tentou, inclusive na reforma de dois mil e dezenove e não se passou. Era colocar lá no dispositivo do artigo 25, um parágrafo, a questão da legítima defesa esculpante, que é quando o agente está sob o efeito astênico, um efeito emocional. Um efeito de medo, perturbação ou susto. Nesses casos, ainda que o cidadão tivesse aplicado um excesso e tivesse dado muitos tiros, muitos disparos, entrasse em pânico e desse 15 facadas para se defender de um estuprador, por exemplo, ele está sob o efeito ali produzido. Ele está em pânico! Então, o temor, o medo, a perturbação, causa no cidadão isso. Ele não está fazendo de má-fé! Ele não está fazendo aquilo por que ele é ruim. Não é efeito de vingança, não! É de medo, perturbação, susto, sobrevivência. É um efeito de sobrevivência! Isso é reconhecido na Alemanha, em Portugal e na Espanha! Na Alemanha desde o século XIX. Dizer que isso não pode entrar na nossa legislação, porque isso vai autorizar a letalidade policial é ir na contramão da legislação mundial. É negar um fato inerente ao ser humano. É ontológico ao ser humano! E essa questão da legítima defesa esculpante se aplica para qualquer um, cidadão comum ou policial. É para qualquer pessoa que se encontre numa situação de medo, perturbação ou susto, que esteja, por exemplo, num encontro armado. Essa, com certeza, me parece ser a principal. Me parece que nos demais é mera interpretação.

ANFITRIÃO:

Qual a sua perspectiva sobre a relação entre a interpretação jurídica e as mudanças na sociedade em relação à violência?

CONVIDADO:

A interpretação jurídica pode ser feita por qualquer um de nós. Pode ser feita pela sociedade, pode ser feita pelo juiz, a julgar mas, qualquer um pode interpretar uma norma, pode interpretar uma lei. Não precisa ser juiz para interpretar uma lei! Eu acredito que a sociedade que é vítima da violência e sobretudo, me parece que quem mais é vítima de violência no Brasil é a camada mais pobre da população, que é aquela que pega ônibus todo dia, que pega seu celular, que está pagando em prestações 20 vezes, e é assaltado no ônibus, é assaltado no meio da rua. Essa pessoa que não tem acesso a condomínio fechado, com segurança, carro blindado, essa que está mais sujeita à violência! E me parece que essa, muitas vezes, tem interpretação de que a justiça não funciona, de que a lei é muito frouxa! Esse é um sentimento social que aflora da camada mais pobre. E eu acredito até que as pessoas ficam pensando que a interpretação jurídica precisa ser feita de uma forma mais rígida. Em contraponto, a gente vê que a interpretação jurídica dos vários juristas, tanto dos tribunais superiores quanto de muitas pessoas que têm a liberdade de escrever seus livros - eu também escrevo os meus, Graças a Deus a gente tem essa possibilidade. Mas, se a gente tem colegas, também, que pensam um pouco parecido como eu, grande parte das pessoas tem a interpretação, que o colega Douglas Fischer fala, que, no Brasil, a gente vive, às vezes, o "Garantismo Hiperbólico Monocular". Palavra grande e feia! Garantismo Hiperbólico Monocular: em muitos dos julgados, em muito do que se escreve da literatura penal, principalmente, processual penal, ela só olha para o réu! Só olha para o direito do réu. E o réu tem que ter direito? Tem! Botam uma lupa e só pensa nele! Por isso que ele é monocular, que só bota o olho no réu. Esquece a vítima! E a vítima, muitas vezes, pode ser uma vítima - a pessoa física, ou a vítima pode ser toda a sociedade! E hiperbólico: aumenta todos os direitos ao máximo, ao máximo do máximo, no máximo, ao ponto de, muitas vezes, por exemplo, algumas propostas de reforma do processo penal quase que inviabilizarem a persecução penal!

Muitas vezes acontece isso. Então, existe essa tensão entre o que a sociedade pensa, interpreta, principalmente, a sociedade que está sujeita à violência, dessa outra camada que, com todo o respeito, não está tão sujeita à violência! Eu não quero dizer aqui, que fique bem claro, que eu incentivo a nenhum tipo de violência, de vingança privada contra réu, nem que o réu não tenha direito. Não! Pelo contrário, o réu tem que ter direito! Todos têm que ter direito! Mas, a vítima, também, tem que ter direito! A sociedade também tem que ter direito! Existe o princípio alemão, que é o Princípio da Vedação da Proteção Deficiente. No Brasil, eu acredito que, muitas vezes, está acontecendo isso e gente não conversa, não fala, porque a sociedade em si, o direito fundamental à segurança pública está sendo colocado de lado. A gente tem graves problemas com o sistema penitenciário. A gente tem que resolver isso! A gente tem que ter mais vagas. A gente não pode deixar o cidadão ali entulhado. Não é ressocializado! Sai pior do que entrou, contribui para aumentar a criminalidade. Mas, também, não quer com isso que a gente tem que colocar todo mundo para fora, soltar todo mundo! Eu vejo que a sociedade, por exemplo, não quer! E eu acredito que essa pessoa que não tem condições de voltar à sociedade não pode voltar para a sociedade nesse momento, pelo menos. Em outro momento, pode até voltar. Mas, essa tensão entre sociedade que está sujeita a violência, que tem uma interpretação jurídica mais restritiva, que quer que as pessoas fiquem presas mais tempo, que querem mais segurança, que querem que hajam punições maiores também, porque a pena não é só para ressocializar - a pessoa que esquece que a pena é para punir, também - e a interpretação, muitas vezes de juristas e vários tribunais de que a gente tem que perceber a ideia só com base nos direitos fundamentais do réu.É complicado!

ANFITRIÃO:

Como os profissionais da área jurídica podem aplicar os conceitos discutidos em sua pesquisa no cotidiano forense.

CONVIDADO:

Os profissionais podem aplicar os conceitos discutidos, principalmente na questão da discussão dos limites da ação de legítima defesa. Só, dando um resumo do que seja os conceitos: Muita gente não aprofunda isso no direito brasileiro! A legítima defesa tem dois elementos. Existe a situação de legítima defesa e a ação de legítima defesa. Situação de legítima defesa é agressão injusta. É um sujeito que vem, me ataca com uma faca, com uma arma de fogo, com um pedaço de cano de ferro. Essa é a situação de legítima defesa; a agressão injusta, atual e iminente. A ação de legítima defesa é a Ação, o direito que eu tenho, eu, o agredido, tenho de me defender. É ação defensiva! É a ação de legítima defesa. E a ação de legítima defesa, a minha ação defensiva ela tem do brasileiro dois requisitos: a necessidade e a moderação. A ação da legítima defesa, ela é necessária, o nome já diz, quando há necessidade de proteger o meu bem jurídico. Ao mesmo tempo, eles são requisitos e limites da ação de legítima defesa, porque eu tenho que usar os meios necessários, disponíveis e não duvidosos. Muita gente não fala essa questão e o direito alemão fala e eu trago no meu livro! Significa dizer o seguinte: contra uma arma de fogo, eu não vou jogar um pau nele! Eu vou usar outra arma de fogo! Se o "cara" vier com faca - faca mata!- eu vou com a faca. É um meio necessário. É um meio eficaz. Outra coisa; o meio tem que ser eficaz! Tudo isso se fala muito na Alemanha e aqui não se disute isso direito. Meio eficaz e não duvidoso! Por exemplo: se o "cara" vir com uma faca, não é para eu dar um tiro de "taser" nele, não! Porque "taser" pode falhar e a faca mata! E "taser" é para usar contra ameaça não letal. Posso até usar o "taser", mas, estou me arriscando! Contra uma faca, se eu tiver a arma de fogo eu posso usar, porque é um meio eficaz, de eficácia não duvidosa, enquanto um "taser" tem uma eficácia duvidosa! Ele pode não funcionar, porque o "cara" está sob efeito de entorpecente! Enfim, mil coisas podem acontecer! E eu tenho um outro requisito limite, que é a moderação. A moderação significa que eu posso exercer do meu meio disponível enquanto estiver durando a agressão. E aí, no caso da arma de fogo, fica bem latente! Moderação é: eu vou continuar atirando no meu agressor até ele cessar a agressão. Então, moderação na arma de fogo vai ser isso. Eu vou atirando tantas vezes quantas forem necessárias. O problema é que as pessoas foram fazendo construções e criando número de tiros! Em todos os meus casos pesquisados, são casos em que alguém está atacando o "cara" com uma faca, com arma de fogo, com um pedaço de cano, com uma arma contundente. Então, sua vida ou sua integridade física está em risco! E tem vários casos que o "cara" está sendo atacado com revólver e o "cara" diz: Olhe, mas a conduta só é moderada, a sua ação de legítima defesa - que é a resposta dele - só é moderada se você só der dois tiros! O "cara" deu três é excessiva! Então, como aplicar os meus conceitos discutidos no cotidiano forense? Trazendo os vídeos de Bosco ou de outros peritos, mostrando que tiro de arma curta ou de fuzil, ou de 12, tiro de arma de fogo não derruba ninguém! Não impulsiona o cara para trás! Não derruba, não tem esse poder de "stopping power", de derrubar o "cara". E, segundo: a questão da medicina, dizendo que a lesão, mesmo atingindo a partes vitais - aorta, pâncreas - a hemorragia vai demorar segundos, vai demorar minutos, vai demorar horas. E que o "cara", mesmo se receber um tiro no coração, ainda tem 15 segundos e que ele só realmente fica incapaz, mesmo, se receber um tiro no meio da cabeça, no tronco encefálico ou no começo da medula espinhal, na C1 ou C3, que é muito difícil acertar! Na prática, no dia a dia, nos encontros armados, a gente não vê esse tipo de tiro! Só se for um tiro de Sniper! Na cabeça, faz o mecanismo de lesão secundária, porque o fuzil tem muita velocidade, mesmo que não pegue diretamente no tronco encefálico, pela dissipação de energia, acaba estourando o tronco encefálico do camarada. Mas, se não for um tiro desse, o camarada leva dois, três, quatro, cinco, seis tiros e continua combatendo por um minuto, dois minutos! Tudo isso, os vídeos da física, as fórmulas da física, os conceitos do sistema nervoso central, comunicação, tudo isso para quebrar esse paradigma do número de disparos. Não se pode pensar em número de disparos! Temos que pensar que: são tantos disparos quanto necessário até cessar a agressão. Porque eu posso dar cinco disparos e o "cara" continuar atirando! Posso dar um disparo e o cara pode parar! Cada caso é um caso! E ainda tem aquela questão da incapacidade psicológica: o "cara" pode dar dois tiros, o "cara" parar. Mas eu posso dar cinco, o "cara" ser um cangaceiro!...Os "cabras" da "Aracuan" levaram não sei quantos tiros aqui e foram ser achados na caatinga não sei quantos dias depois, o corpo do "cara"...trocando tiro com a Polícia Federal. A gente vê muito caso, do camarada que tem problema mental, o "suicide by cop", o cara vai se matar, ele vai para cima da polícia para morrer e ele quer levar tiro mesmo! Enquanto ele não cai, ele vai levando dois, três, quatro, cinco, seis, sete tiros! Resumindo: toda essa parte de física e medicina trazida e mostrando com vídeos de peritos oficiais pode contribuir muito para o advogado de defesa no júri, para a preparação do promotor, inclusive, para rediscutir questões, verificar que o "cara" teve excesso porque verificou no vídeo que havia incapacidade psicológica e o "cara" continuou atirando! Enfim, os conceitos de incapacidade balística, servem para meios de prova, para trazer ao Direito o que é mais real, mais verdadeiro, para o caso concreto, seja para absolver, seja para condenar.

ANFITRIÃO:

Dr. Tiago, caminhando para o final da nossa conversa, repriso meus agradecimentos pela sua participação e esclarecimentos e deixo este espaço para suas considerações finais. Grande abraço!

CONVIDADO:

Foi um prazer nossa conversa! Eu me coloco sempre a disposição aqui de todos os seus ouvintes. Meu e-mail é tiagoantunesdeaguiar@gmail.com. Meu instagram é o Tiagoaguiar 45. Lá, eu trago questões minhas e questões do dia a dia de professor, de aulas! A gente pode trocar ideias lá, quem quiser! E é um tema que eu acho que vale a pena reflexão. É um tema que está bem discutido - querendo ou não - pela parte das Ciências Policiais. Meu livro está disponível tanto na Amazon quanto na D'Plácido. "Ação de legítima defesa em tribunais de justiça brasileiros. Moderação e balística Terminal". Quem quiser trocar dúvida, estou sempre à disposição! Eu acho que esse tipo de conhecimento aqui tem que ser chegado para todos nós, porque é um sentimento que a gente tem de fazer justiça, justiça para todos! Repetindo: 80% da minha pesquisa, de meus casos, foi um criminoso atacando uma pessoa física. 80% dos casos você tinha civil atacando civil e só 20% foi policial atacando civil. Significa que essa discussão atinge a todas as pessoas, não só aos policiais. Ela atinge toda a sociedade! A gente precisa levar essa discussão para o júri e para outras questões também! Discussões pré-processuais e que, inclusive, se possível, que nem houvesse inquérito contra uma pessoa que estivesse em legítima defesa, porque é um tormento! Muito obrigado a todos, me encontro à disposição. Grande abraço!

ANFITRIÃO:

Honoráveis Ouvintes, este foi mais um episódio do Hextramuros Podcast. Sou Washington Clark dos Santos, seu anfitrião! No conteúdo de hoje, finalizamos a entrevista com o juiz federal Tiago Aguiar, versando sobre a ação de legítima defesa em tribunais de justiça brasileiros, objeto de recente obra lançada por ele. Acesse www.hextramurospodcast.com! Saiba mais sobre este conteúdo e compartilhe nosso propósito. Será um prazer ter a sua colaboração! Pela sua audiência, muito obrigado e até a próxima!

Links

Chapters

Video

More from YouTube